Sobre Literatura Clássica – Nichele Lopes

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Nichele Lopes – Professora de literatura, formada pela UFRGS, pesquiso sobre formação leitora (com foco em crianças e adolescentes). Sou católica, mãe e uma grande defensora da leitura movida pelo prazer de ler.

1. Conheço algumas pessoas que atacam os clássicos, outras que os defendem com unhas e dentes. Primeiramente, o que é um clássico?

Gosto de chamar os clássicos de “livros eternos”. São aqueles livros que, mesmo escritos há 100, 200, 300 anos, continuam fazendo sentido claro nos dias de hoje. Quando você lê um Memórias do Subsolo, do Dostoiévski, e se identifica com o pior daquele homem, você está contemplando o melhor que um clássico tem para oferecer. Aquele personagem foi criado de um jeito tão complexo e profundo que pode ser qualquer um de nós, mesmo no Brasil de 2023, um contexto tão diferente do de sua criação.

2. Como ler clássicos nos auxilia em nossa própria vida?

Pegando o gancho da resposta anterior, eu diria que os clássicos contribuem principalmente para o autoconhecimento. A identificação com os sentimentos e com as ações de personagens não tão legais assim, como o próprio homem do subsolo, nos ajuda a perceber quem nós somos. Particularmente, adoro me identificar com personagens mais defeituosos justamente porque consigo sair da obra com alguns insights bem pessoais, consigo refletir sobre valores, virtudes etc.

3. Qual a importância de ler livros contrários às suas ideias?

Conhecimento. Você precisa conhecer para amar e para odiar. Uma pessoa que se diz interessada em estudar sobre educação e se diz contrária às ideias de Paulo Freire, por exemplo, precisa ter lido pelo menos as duas obras principais do autor. Sem ler a fonte direta, sem ler a obra em si, você não sabe sobre o que está falando, você não sabe dizer exatamente o que há de errado.

4. Para uma pessoa que nunca leu nada e gostaria de começar, que dica você daria?

Leia! Se você nunca leu absolutamente nada na vida, comece por livros teóricos de assuntos que te interessem, ou por alguma obra literária que seja parecida com as séries que você assiste. Mas leia! Vá introduzindo a leitura na sua vida e, aos poucos, você vai encontrando livros que realmente te interessem e agreguem algo na sua vida.

5. A discussão sobre literatura clássica e literatura contemporânea é levantada diversas vezes em tom de briga. Como você aborda esse tema?

Acredito que a polêmica de clássicos vs. contemporâneos é menos polêmica que parece. As pessoas precisam admitir duas coisas: i) a literatura contemporânea é, até segunda ordem, subliteratura, ii) ler literatura contemporânea é sim uma porta de entrada para o mundo dos clássicos. Entendendo essas duas coisas, não existe motivo para brigar. Haha! O grande problema é que hoje nós temos muitos produtores de conteúdo que, patrocinados por editoras, vendem a ideia de que a leitura de literatura contemporânea é tão válida quanto a leitura da literatura clássica. Há uma espécie de campanha para a mediocridade e tem gente ganhando muito dinheiro com isso. Porém, do outro lado, nós temos produtores de conteúdos que tratam o adolescente leitor de romances adolescentes como um idiota completo, não com alguém com potencial para virar um grande leitor. Eu com 15 anos transitava entre Nicholas Sparks e Machado de Assis, é normal ler “coisas ruins” quando se está se formando como leitor. Tudo é uma questão de compreender fases e dar tempo ao tempo.

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