Sobre Educação Infantil – João Malheiro

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1. Atualmente muito se tem discutido sobre os mais diversos métodos de educação. Primeiramente, o que é educação e para que ela serve de fato?

Eu costumo defini-la como a arte de cooperar com a natureza humana de uma criança, auxiliando-a a desenvolver as suas diversas potências nas fases certas da vida – potência sensório-motora (educação infantil), potência afetiva (Fundamental I), potência racional (Fundamental II), potência volitiva, da força de vontade (Ensino Médio), de maneira que a criança consiga chegar ao final do Processo educativo (Vida Universitária) com uma boa e forte potência social e espiritual, de maneira que possa identificar com mais clareza a própria identidade (afinal, quem eu sou, de onde vim e para onde tenho que ir) e o Projeto de vida, necessários para existir um correto sentido na vida e saber a quem temos que nos entregar nesta vida para chegarmos com segurança depois à nossa Pátria definitiva.

2. Mães e pais costumam reclamar acerca do mau comportamento dos filhos. Como uma educação baseada nas virtudes pode ajudar?

Os pais reclamam do mau comportamento dos filhos porque não conhecem essas potências acima citadas e não sabem mais quem é o SUJEITO que eles têm que educar, como primeiros e principais educadores. Quando se entende bem o conceito de virtude os pais sabem como ir formando essa afetividade da criança e aos poucos aprenderão como elas deverão conquistar a sua própria autonomia – capacidade da criança realizar sozinha as próprias tarefas que ela já pode fazer, sem mais a ajuda dos pais – e posteriormente a própria liberdade interior com a respectiva responsabilidade. O que são virtudes? A criação de um hábito bom, fruto de ações concretas repetidas diariamente durante várias semanas até se gerar um “gatilho mental” de agir corretamente, que de alguma maneira encaminhem corretamente as emoções dos primeiros anos da vida, uma vez que até aos 6 anos de idade ela não goza de capacidade racional e por isso não tem a menor condição de controlar ou direcionar positivamente seus impulsos emocionais para a escolha correta. Concluindo, quando vemos jovens reclamando dos pais, mais do que culpá-las, os pais deverão refletir antes onde falharam nesse processo de educação das virtudes, de maneira que percebam que nenhuma criança nasce desobediente, mentirosa, egoísta ou preguiçosa, mas que se fazem dessa forma por ter faltado alguém que os auxiliasse a amadurecer corretamente durante os anos do Projeto educativo (0 aos 18 anos).

3. É muito comum encontrar crianças, jovens e adultos que não conseguem fazer atividades básicas, como ler e fazer contas. Quais as consequências de avançar sem garantir essa base?

Uma criança que não aprender a ler e a fazer contas – instrumentos básicos do pensamento humano – dificilmente poderá se tornar aquela pessoa que Deus quer que ela se torne durante a sua existência. Sem a capacidade de descobrir a verdade objetiva sobre a sua própria existência, que vem por meio do estudo, leitura, pensamento, lógica, expressão, meditação, oração e narrativa do seu passado, presente e futuro, dificilmente conseguirá descobrir quem ela é e quem terá que amar, por meio de um Projeto de vida. Portanto, como podemos concluir, muito antes de algum educador estar preocupado em ensinar a algum aluno o que ele poderá fazer na vida, por meio de uma atividade profissional digna (meta da maioria das escolas particulares e públicas), antes ele tem que ajudar seu pupilo a descobrir o seu verdadeiro ser, seu sentido na vida. O ser deve vir antes do fazer. Somente quem se encontrou nesta vida, poderá definir melhor qual será o fazer, o seu trabalho mais correto e coerente com todas as suas capacidades, dons, inclinações, gostos, temperamento, sexo (que ninguém escolhe, mas que vem como de “fábrica”), pois estará a serviço desse Projeto de vida que seu Criador pensou para ele desde toda a eternidade. Quantas pessoas conseguem aprender a fazer muitas coisas no campo profissional, conseguem um razoável sucesso profissional e econômico, mas no final da vida se sentem fracassadas e vazias existencialmente, porque na verdade não se tornaram aquelas pessoas que Deus queria que fossem e muito menos, infelizmente, conseguem amar alguém de verdade ao longo da sua existência.

4. Uma das maiores dificuldades dos pais é discernir em quais momentos deve haver carinho e em quais deve haver firmeza. Qual conselho o senhor tem para esses pais?

A verdadeira autoridade – aquela que faz crescer as cinco potencialidades da criança de forma correta e no momento certo, conforme vimos acima – nasce nos pais quando se tornam profundos conhecedores da ciência educativa. Uma “autoridade” em medicina, em matemática, em engenharia de foguetes, a título de exemplo, é aquela pessoa que seu conhecimento é reconhecido publicamente, pela sua sabedoria. Essa mesma autoridade deverá existir num pai, professor, tutor, sacerdote, pastor, como fruto do seu real interesse em estudar educação e interiorizar esses conhecimentos, de maneira que na hora que tenha que ensinar as virtudes necessárias para uma criança, por exemplo, esse educador demonstrará tanta convicção e tanta assertividade que o educando conseguirá intuir que essas exigências, por mais difíceis e sacrificadas que sejam, são necessárias para ela se tornar uma pessoa melhor e, com o tempo, feliz! Perceberá que essa forma de educar mais firme é a verdadeira forma de demonstrar carinho. No final, agradecerão porque tiveram pais que viveram de forma honesta e desprendida, sem querer nada em troca. Muitas famílias, muitas vezes sem perceber, educam de forma egoísta os filhos, porque os instrumentalizam com constantes negligências ou permissivismos, que no fundo são buscas de compensações, consolos ou preencher vazios sentimentais.

5. Como lidar de modo saudável com o uso de celulares e dispositivos eletrônicos? Quais as consequências da exposição excessiva a esses equipamentos?

Os eletrônicos em geral estão se tornando instrumentos muito mais de fuga da realidade do que de meios de comunicação, informação ou diversão. Se pesquisarmos as horas que os jovens e adultos gastam hoje nessas ferramentas, concluiremos que estão muito acima das necessidades reais. Por isso, é preciso educar os jovens a moderarem esses desejos de estarem conectados, como se deve educar outros impulsos que também os jovens apresentam com a comida, a bebida, o esporte, a música e todos os tipos de diversão. Portanto, mais do que ser CONTRA OS ELETRÔNICOS, temos que ser a favor dos verdadeiros prazeres da vida, aqueles que duram muito mais e nos enriquecem como seres humanos e como pessoas. Formar os filhos em boas leituras, em grandes amizades, em alto projetos magnânimos os levarão a se afastar de forma INTELIGENTE desses aparelhos, porque se sentirão muito mais livres e maduros gastando o tempo em outros objetivos muito mais realizadores.

João Malheiro possui graduação em Administração de Empresas pela Universidade de São Paulo/USP (1984), mestrado em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ (2003), com ênfase em Projeto Político Pedagógico e doutorado pela mesma Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ (2008), aprofundando no tema da motivação no ensino-aprendizagem e como ela se relaciona com a vivência e o ensino das virtudes éticas/morais. Tem mais de 40 anos de experiência na área de Educação, atuando principalmente nas seguintes áreas: antropologia filosófica, ética das virtudes na família e na escola, motivação transcendental e a liberdade personalizada, educação da afetividade, educação personalizada e Metodologia de ensino-aprendizagem single-sex. Atualmente, está promovendo o colégio Porto Real, no Rio de Janeiro (Barra da Tijuca), inspirado no modelo espanhol Fomento Centros de Enseñanza – www.fomento.edu -, onde é o diretor da unidade masculina. Compagina essas atividades com Cursos e palestras em diversas instituições educacionais públicas e privadas. Dá conferências por todo o Brasil em escolas e faculdades sobre Educação Personalizada e a Ética das virtudes. Neste ano, viajou para 21 cidades dando conferências ou participou de Congressos ou Workshops sobre essa temática. Lançou em 2010 o livro A ALMA DA ESCOLA DO SÉCULO XXI, em 2012 o livro FORTALECER A ALMA DA ESCOLA, em 2014 o livro ESCOLA COM CORPO E ALMA, um manual de ética para pais, professores e alunos. Todos estes livros pertencem à Editora CRV (Curitiba). Em 2017, lançou o último livro dessa tetralogia educacional, intitulado A PRECEPTORIA NA ESCOLA, da Editora Quadrante. Em 2021, lançou o livro mais ligado à educação de adolescentes, intitulado A CONSTRUÇÃO DA AMIZADE, pela Editora Cultor de Livros e, este ano de 2022, na mesma editora, o livro também voltado para esse mesmo público: A FÉ NA PRÁTICA. Em 2019, entrou nas redes sociais e por meio delas tem orientado milhares de famílias, com destaque especial para o Instagram – @jebmalheiro – na qual desenvolve vários cursos de formação de pais. No ano passado, ganhou duas medalhas de especial destaque na área da educação: a primeira pela ALERJ – a Medalha Tiradentes – e a segunda, pela Fundação Biblioteca Nacional. Neste mês foi escolhido para ser membro da Academia Brasileira de Filosofia, sede no Rio de Janeiro.

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