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Içado até a superficialidade da vida pelos instintos naturais mais básicos, o homem natural se torna incapaz de perceber a sua necessidade de primeira ordem, ter paz com Deus. Isso acontece porque existem verdades que os olhos humanos não conseguem discernir e, para os quais, os ouvidos humanos são surdos, necessitando, portanto, de um entendimento além do natural para serem acessadas. 

Aristóteles entendia que as coisas cognoscíveis e primeiras para o indivíduo são, amiúde, pouco cognoscíveis por natureza e captam pouco ou nada do ser. Ou seja, o que é principal na vida do homem não conseguimos acessar em primeira instância, sendo percebido primeiro o que é de menor valor para o ser humano. Para nós vem depois justamente o que se encontra antes, uma vez que, conseguimos perceber facilmente as coisas sensíveis, como as nossas necessidades físicas, a fome corroendo nosso estômago, a sede provocando cefaleia, os desejos sexuais roubando a serenidade. Já em uma segunda camada de percepção, temos nossas necessidades emocionais, como a necessidade de aceitação, autorrealização, auto estima, afeto, entre outras, que, apesar de preponderar sobre as de primeiro entendimento, só a percebemos quando se tornam distúrbios de maior intensidade, uma depressão, uma ansiedade, que somatizam. Ao provocar reações na camada de maior percepção, conseguimos acessar as necessidades relativas aos meandros dos pensamentos, porém mesmo percebendo, a maior parte das pessoas, ainda não conseguem entender nem expressar tais necessidades. 

E, como uma camada de última percepção, porém de primeira ordem, temos a necessidade da alma. Sendo que, da mesma forma que as emocionais preponderam sobre as sensíveis, as espirituais sobrepujam sobre todas as outras e, também, originam mazelas em todas as ordens de necessidade e camadas de percepção. Essa necessidade primeira, precisa ser descortinada diante dos olhos naturais para que, então, seja entendido a necessidade urgente e irremediável de reconciliação com o pai, de paz com Deus.

Paz com Deus não significa ausência de guerras, nem libertação das dores físicas, das doenças ou tribulações, também não se refere a uma consciência limpa, uma estabilidade emocional, ou uma mente organizada. Não a conseguimos através de nossos atos de caridade, do cuidado com os pobres, da libertação dos cativos e oprimidos, muito menos, da luta de classes. A paz com Deus está acima de tudo isso, pois se refere a um estado da alma e, por isso, um estado de todo o nosso ser, no sentido ontológico. Sua ausência impõe-se como um fardo que se irradia para todas as áreas da nossa vida trazendo inquietação. Esse estado foi ilustrado por Jesus na parábola do filho pródigo que rompe o laço de obediência com o pai e desperdiça os seus bens vivendo, irresponsavelmente, em busca de seus próprios prazeres, e, ao passar necessidade, ele percebe que tinha algo errado, porém, ao retornar para casa, ele deseja ser tratado como empregado, demonstrando que a rebeldia trouxe uma alteração na sua identidade ao ponto que, ele não se reconhecia mais como filho, essa é a situação perfeita para ilustrar a ausência da paz com Deus. A desobediência traz culpa, o homem assim foge mesmo sem ser perseguido; traz a perda da identidade, o homem assim já não sabe o papel que desempenha; traz a escravidão, o homem assim não consegue mais enxergar a liberdade; traz cegueira, o homem assim sempre volta para a beira do abismo; traz vazio, o homem assim é como palha seca levado para todas as direções; traz falta de propósito, o homem assim vive uma constante busca para saciar as necessidades mais básicas.

Em contrapartida, a presença de tal condição traz leveza na alma para encarar as dificuldades, traz convicção da identidade, traz liberdade para cumprir as responsabilidades, traz completude acabando com a busca desvairada por algo mais, traz esperança de dias melhores. A satisfação do maior anseio do homem põe novamente a engrenagem para rodar fazendo florescer todas as áreas da vida, inclusive a emocional e física, não por falta de tribulação, mas pela concordância com o seu criador.

A expressão, Paz com Deus, nos é apresentada, pelo Apóstolo Paulo, no capítulo 5 de Romanos, como um benefício para aqueles que, pela fé, são justificados. É uma reconciliação com o Pai através da fé em Cristo, ou seja, todo homem vive como inimigo de Deus quando está na mentalidade do pecado, buscando satisfazer seus próprios desejos, na desobediência, até o momento em que recebe o espírito de Cristo e faz o caminho de volta, o caminho de amizade com Deus, o caminho da reconciliação, da Paz com Deus.  

O maior desastre na vida do homem é quando sua vida é pautada pelos anseios mais básicos, pela satisfação de seus instintos, ou ainda, pela busca desenfreada da satisfação das necessidades emocionais. Esse homem é fisgado como um peixe até a superfície e, ao viver fora do seu habitat natural, já não consegue enxergar nada além de um abismo imenso dentro de si mesmo, uma necessidade de satisfação que a superficialidade nunca conseguirá solucionar. 

Em suma, não podemos esquecer das necessidades físicas e emocionais como se elas não existissem, elas existem e precisam ser saneadas e cuidadas. Porém, o grande erro da humanidade é fingir que o anseio da alma é apenas um delírio religioso, uma vez que este, certamente, é o maior e mais importante anseio do homem, a Paz com Deus é onde tudo deve começar. Antes de qualquer coisa em sua vida, busque a reconciliação com o Pai.

 

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